Na tarde desta quarta-feira (24/04), o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) submeteu ao Congresso Nacional o primeiro projeto de lei complementar (PLP) visando regulamentar a reforma tributária dos impostos sobre o consumo.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), entregou pessoalmente a proposição ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), por volta das 17h45 (horário de Brasília), inaugurando assim uma nova fase na discussão sobre o novo sistema tributário.
Este sistema, fundamentado no modelo de Imposto sobre Valor Agregado (IVA), conforme estipulado na Emenda Constitucional (EC 132/2023), promulgada pelo Poder Legislativo no final do ano passado, é considerado uma prioridade pela equipe econômica do governo e era aguardado com grande expectativa pelos parlamentares.
Este é o primeiro de dois projetos de lei complementar que serão encaminhados pelo Executivo ao Legislativo, abordando uma série de aspectos que requerem maior detalhamento no novo modelo tributário. O próximo está previsto para ser apresentado na primeira quinzena de maio, com apenas 10 semanas restantes antes do recesso parlamentar.
A Emenda Constitucional contém aproximadamente 70 referências à necessidade de regulamentação por meio de lei complementar em áreas específicas, incluindo o funcionamento dos dois novos tributos – a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), a nível federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a nível subnacional – o Imposto Seletivo (IS), regimes especiais de tributação para setores específicos da economia, regras de transição, o sistema de créditos ao longo da cadeia produtiva e a lista de produtos da Cesta Básica Nacional sujeitos a alíquota zero.
A CBS e o IBS são componentes do Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) dual, que constitui o cerne da reforma tributária do consumo. O IS, de natureza extrafiscal, tem como objetivo desencorajar o consumo de produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. O projeto apresentado hoje também estabelece normas gerais, como o fato gerador, o local da operação, a base de cálculo, as alíquotas, o pagamento e a não cumulatividade, além de regras relacionadas à tributação de importações, à imunidade das exportações e ao modelo operacional.
A Lei Geral também implementa dispositivos como a restituição personalizada (cashback) do IBS e da CBS para famílias de baixa renda, bem como a definição da Cesta Básica Nacional de Alimentos, e inclui os regimes específicos e diferenciados conforme estabelecido na Emenda Constitucional 132/2023.
Quanto ao segundo projeto, que será enviado em maio, ele se concentrará na gestão do IBS, que terá seu próprio Comitê Gestor, composto por representantes dos Estados, municípios e Distrito Federal. O texto abordará aspectos como o contencioso administrativo do novo tributo subnacional e a distribuição de receitas entre os entes federativos.
Apesar da extensão considerável do documento, totalizando quase 300 páginas, a equipe econômica do governo mantém a expectativa de que as discussões em torno da regulamentação da reforma tributária sejam encerradas ainda em 2024. Isso abriria caminho para as próximas fases de uma transição gradual entre os regimes tributários.
Esse objetivo é compartilhado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que expressou sua intenção de levar o texto ao plenário “em 0 ou 70 dias”. Este cronograma leva em consideração o possível esvaziamento do parlamento na segunda metade do ano, devido às eleições municipais, que tradicionalmente mobilizam os congressistas em campanhas locais.
Entretanto, os parlamentares reconhecem que o desafio é complexo. Muitos acreditam que o debate em torno da regulamentação da reforma tributária será mais abrangente do que o ocorrido na primeira fase, que culminou na aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC). Naquela ocasião, havia desconfiança sobre a viabilidade da proposta, dada a história de tentativas fracassadas ao longo de décadas.
Alguns parlamentares apontam que houve uma certa precipitação com a rápida votação da matéria e afirmam que os setores agora estão mais organizados e dispostos a exercer uma pressão maior no Congresso Nacional. Além disso, a complexidade e detalhamento dos textos também são vistos como obstáculos na busca por um consenso.
Antes mesmo de o governo federal revelar suas propostas de regulamentação da reforma tributária, uma coalizão composta por 24 frentes parlamentares lançou um conjunto de 13 projetos de lei abordando pontos específicos que necessitam de detalhamento, conforme mencionado na Emenda Constitucional.
A antecipação da apresentação dos textos reflete uma iniciativa dos parlamentares para impulsionar o debate e expressa um descontentamento com a limitação do diálogo com o Poder Executivo. Além disso, ela reforça a manifestação de posicionamentos por parte dos congressistas (e de setores econômicos com representatividade política) à medida que a discussão se intensifica nas próximas semanas no parlamento.
No que diz respeito ao governo, há uma preocupação em relação à distribuição das relatorias dos projetos. A preferência da equipe econômica seria por nomes como Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) na Câmara dos Deputados e Eduardo Braga (MDB-AM) no Senado Federal. Ambos atuaram como relatores da PEC da reforma tributária, acumulando assim experiência tanto em conhecimento técnico quanto em negociações com os setores envolvidos.
No entanto, Arthur Lira ressaltou que a decisão ainda não está definida e destacou que os relatores “não necessariamente” precisam ser os mesmos da PEC. Ele mencionou a existência de uma “quantidade considerável de deputados competentes que também desejam relatar essas matérias”. Além disso, ele explicou que está em discussão a possibilidade de criar dois grupos de trabalho, com composição reduzida, para lidar de forma independente com as agendas e discussões relacionadas ao tema.
“Tem projetos do parlamento que também tratam sobre essas regulamentações. Nós ainda nem discutimos se vão ser dois relatores. Tem deputados pedindo para que se criem dois núcleos, como se fossem dois grupos de trabalho, para dar oportunidade a outros parlamentares”, disse o congressista em conversa com jornalistas nesta tarde.
“Não tem necessariamente que ser o mesmo relator. Por isso, há a possibilidade de se formar dois grupos com quantidade reduzida, para cada um cuidar das agendas e das discussões”, afirmou.
Haddad, em conversa com jornalistas, destacou que, apesar do nível de detalhamento ser maior, a tramitação dos textos de regulamentação da reforma tributária deve ser mais “leve” no Congresso Nacional. Isso porque projetos de lei complementar exigem quórum de maioria absoluta (257 de 513 votos na Câmara dos Deputados e 41 de 81 no Senado Federal) em uma única votação − ao contrário de PECs, que precisam de apoio e 3/5 em dois turnos de votação em cada casa legislativa.
“Um segundo aspecto importante é que a lei tem que cumprir a Emenda Constitucional. Portanto, os parâmetros já estão fixados. Nós já estamos em outro nível de detalhe. Os grandes temas que foram já deliberados estão na Emenda Constitucional. Agora, na lei complementar, você vai detalhar. Então, na minha opinião, o nível de tensão vai diminuindo a cada etapa. E é normal que haja negociações com setores da sociedade”, complementou o ministro.
Os projetos de regulamentação da reforma tributária foram elaborados no Ministério da Fazenda com base nos relatórios elaborados pelo Programa de Assessoramento Técnico para a implementação da Reforma da Tributação sobre o Consumo (PAT-RTC), coordenado pela Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária (Sert). No total, 19 grupos técnicos foram constituídos, com participação de representantes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios.
Autor: Simples Soluções Contabéis
Referência: Asis
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